Estamos todos cansados

Foram muitas as impropriedades que o povo brasileiro teve de escutar sobre o futuro do senador Delcídio do Amaral, investigado pela Operação Lava Jato, especialmente na seção de votação pelo Senado sobre manter ou não a decisão de prisão autorizada pelo Supremo Tribunal Federal. Entre discursos desesperados de quem faz o que pode para não ser arrastado pela lama da corrupção, uma voz lúcida marcou os noticiários na manhã de 25 de novembro. Foi a da ministra e vice-presidente do STF, Cármen Lúcia Antunes Rocha, e peço licença aqui para reproduzir algumas de suas palavras:

“Aviso aos navegantes dessas águas turvas de corrupção e das iniquidades: criminosos não passarão a navalha da desfaçatez e da confusão entre imunidade, impunidade e corrupção. Não passarão sobre os juízes e as juízas do Brasil. Não passarão sobre novas esperanças do povo brasileiro, porque a decepção não pode estancar a vontade de acertar no espaço público”.

Desconfio de que a fala da ministra tenha injetado uma boa dose de ânimo naqueles que, por pouco, quase perdem o estímulo de batalhar pelas mudanças, diante do cinismo de pessoas que estão grudadas ao poder e de todo prejuízo com que a sociedade arca em função disso. Estamos todos exaustos, é verdade, resistindo como podemos ao que se conhece como a Síndrome de Burnout, caracterizada pelo esgotamento físico, emocional e mental de um indivíduo no desempenho de sua profissão.

Quando acometidas por esse distúrbio, as estruturas do corpo e da mente colapsam. Desistem. Entregam as rédeas da vida.

E o que tudo isso tem a ver com a Saúde?

No fundo, o mesmo ocorre no nosso setor. Com a falta de condições de trabalho decentes, somada a longas jornadas e a processos complexos, desorganizados e desestruturados, é difícil resistir. Observamos o uso da Saúde para negociações políticas, nomeações ou indicações de cargos para pessoas que não têm histórico, nem comprometimento, mas que, de alguma forma, pertencem ao grupo que deve, naquele momento, ser privilegiado. Engolimos os cortes de orçamento que dilaceram a assistência no País. E esses são alguns dos indicativos de que a Saúde não é tratada com a prioridade necessária.

Às vezes, parece que os cidadãos brasileiros perdem as forças para lutar. A sociedade está vivendo um colapso mental, espiritual e vocacional, assistindo aos rumos de uma pátria completamente dominada e de um setor em que cada vez mais se trabalha, e cada vez menos se tem resultados.

O que nos impede, então, de ruir? Eu diria que é a fé. Aquela fagulha divina que nos liga a uma tarefa, à crença em si mesmo e à missão individual de contribuir para um mundo melhor. Como dizia Santo Agostinho: “A fé e a razão caminham juntas, mas a fé vai mais longe”.

Apesar de tudo, eu acredito no que está por vir. Confio na tomada de consciência que levará as pessoas a votarem com a cabeça, não com o estômago. Porque, na segunda hipótese, o voto nasce da raiva, ou da busca por benefícios garantidos pelo grupo político vencedor. A sociedade tende cada vez mais a desenvolver o senso crítico e a valorizar o império da ética e do bem fazer. Começa a reprovar determinados comportamentos antes aceitos como normais, como o uso de recursos públicos em vantagem própria.

Estamos todos exaustos, é verdade. Mas talvez a persistência esteja nas nossas raízes.

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