Saúde sem qualidade é irresponsabilidade

“Para que fazer enfermagem se quer agir como médico? Enfermagem é cuidado! Entubar, prescrever, diagnosticar e tratar é, sempre foi e será atribuição médica. Não adianta fazer cursinho de b***a. Frustrados!”.

Esse texto chegou a mim entre tantas outras mensagens que recebemos todos os dias pelas redes sociais. Mas não o reproduzo, aqui, na íntegra. Seria uma indelicadeza com você, leitor, que obviamente não acessou meu artigo para se deprimir com demonstrações de agressão e falta de polimento educacional. Além do mais, as poucas palavras contidas nesse trecho bastam. O mau exemplo basta.

Há anos discutimos assistência, qualidade, segurança do paciente, resultados e papel dos profissionais da saúde em toda a linha de cuidado. Investimos tempo, esforço e alma para romper padrões e substituir ideias caducas por outras melhores. Então, aparece esse médico reacionário – um jovem, o que faz doer ainda mais no coração – que debocha de sua própria classe. Eu digo isso porque, ao proferir tais grosserias, adotando um comportamento desprovido do contexto do mundo moderno, esse cidadão incentiva o retrocesso de um setor inteiro.

Não deveria ele formar a elite intelectual desse País?

Pois bem, não é só de medicina que se faz a ética e o conhecimento médicos. Esse jovem profissional não entende o impacto da ação da enfermeira na qualidade assistencial. Não enxerga que ela está envolvida no dia a dia do paciente, enquanto o médico atua de maneira mais intervencionista. Não percebe o prejuízo da visão maniqueísta e simplória da assistência. No fundo, parece não exercer a medicina para salvar vidas, e sim para bajular o próprio ego, fiscalizando se um está querendo avançar no terreno do outro.

É inaceitável que toda a jornada de amadurecimento das instituições e dos profissionais de saúde seja alvejada por uma declaração irresponsável, ou por um equipamento que não recebe a manutenção adequada e cai sobre a cabeça de uma jovem internada. Em função disso, o quadro se agrava e ela não resiste. Essa foi exatamente a ocorrência, tempos atrás, em uma Santa Casa no interior de São Paulo. A moça havia sido atendida com sucesso e, quando já estava se recuperando, sofreu esse acidente banal.

Evidentemente, na saúde, a competência e a consistência do time sobrepõem a ação individual. Por isso, não dá para contar apenas com a sabedoria do pajé da tribo, o único que sabe das coisas. É isso o que o jovem autor da mensagem tenta fazer: reduzir a assistência ao paciente a uma ação absolutamente pessoal.

Antes que vejamos os ideais dos nossos tempos esmagados pelo retrocesso, precisamos nos perguntar: o que estamos fazendo com as discussões que são tão caras à saúde?

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