Artigo: A crise dos hospitais norte-americanos em 2020 e estratégias de superação

Para ajudar nossos associados e demais profissionais da saúde, a Anahp reúne artigos de diversos representantes do setor, com a finalidade de mostrar diferentes perspectivas do impacto da covid-19.

 

Por André Medici, economista social e da saúde*

Como resultado da covid-19, a Associação dos Hospitais Norte-Americanos (AHA) estima que os estabelecimentos de saúde deverão perder US$ 323 bilhões em receita em 2020 (cerca de 29% das receitas de 2019), dos quais US$ 203 bilhões já consolidados no primeiro semestre do ano e US$ 120 projetados entre julho a dezembro, quando os hospitais já se aproximam da reabertura de procedimentos eletivos em meio a picos pandêmicos ainda ativos no sul do país. No primeiro semestre do ano, os estabelecimentos de saúde tiveram um declínio médio de quase 20% no volume de internações e de 35% no volume de procedimentos ambulatoriais, em relação ao inicialmente estimado para o ano. O impacto também levou a uma perda de 1,4 milhões de empregos na saúde, dos quais 135 mil em hospitais, até o mês de abril de 2020.

O impacto financeiro pode ser ainda mais significativo se incluídas as despesas com custos associados à covid-19 em suprimentos e medicamentos, que tiveram seus preços elevados em 64% em relação ao mesmo período do ano anterior. Alta no uso de equipamentos médicos como ventiladores e pagamento de bônus e horas adicionais trabalhadas nas equipes saúde para a covid-19 também levaram a aumentos nos custos.

O Coronavirus Care Act do governo norte-americano autorizou o pagamento de subsídios aos hospitais e estabelecimentos de saúde em até US$ 175 bilhões para o enfrentamento da covid-19, mas este valor está aquém das perdas financeiras destas unidades, estimadas em US$ 323 bilhões. Por outro lado, até fins de junho, somente US$ 103 bilhões desses subsídios haviam sido utilizados pelas unidades, levando associações como a AHA a solicitar recursos adicionais até o fim do ano.

Dados da Fundação Kaiser, para o mês de maio de 2020, mostram que 48% das famílias que tinham intenção de realizar internações ou atendimentos ambulatoriais para algum de seus membros  adiaram esta intenção por até três meses, e 26% estavam dispostas a esperar quatro ou mais meses para evitar problemas de contaminação pelo coronavírus. Adicionalmente, apesar da disposição de autoridades locais na reabertura da economia, beneficiando vários setores de atividade, as restrições em relação ao funcionamento dos hospitais permanecem, tais como:

A obrigatoriedade em manter uma proporção de leitos desocupados para atender o crescimento da demanda pandêmica quando necessário. Por exemplo, no Arizona, as taxas de utilização de leitos não podem exceder 80% e muitos estados têm imposto políticas para reservar entre 20% e 30% dos leitos de UTI de forma exclusiva para atender à demanda potencial por pacientes graves de covid-19;

A exigência de que hospitais e estabelecimentos de saúde mantenham em estoque equipamentos de proteção pessoal (EPP) para o uso de profissionais de saúde e pacientes entre 15-30 dias, obrigando os hospitais a uma política agressiva de reposição de estoques num momento em que os preços desses itens estão disparando. Com isso, o número de cirurgias e procedimentos passa a ter que se ajustar aos estoques disponíveis de EPP;

Muitos estados estão obrigando os hospitais a realizar testes e triagem para pacientes e todo o corpo de funcionários. Em estados como Virgínia e Colorado, funcionários e pacientes são testados para a covid-19 antes de qualquer cirurgia.

Essas políticas reduzem o volume de atividades hospitalares em largas proporções. Um estudo realizado pelo Center of Diseases Control (CDC)  mostrou que, desde que a covid-19 foi declarada como emergência nacional (março) até fins de maio de 2020, houve uma redução da demanda emergencial nos hospitais para pacientes crônicos, se comparada com o mesmo período de 2019, de 23% em relação a ataques cardíacos, 20% em relação a derrames cerebrais e 10% em relação a descontrole por açúcar no sangue.

A superação da crise financeira dos hospitais tem sido vislumbrada através do uso de ferramentas de inteligência artificial para maior nível de controle das despesas, monitoramento dos contratos e cobrança por serviços. Estas ferramentas permitem rastrear espaços para a geração de receita, ganhos de eficiência, renegociação de contratos, interação com pacientes e estimativas de preços para serviços prestados pelas unidades.

Para a reabertura de pacientes não-covid-19, os hospitais têm enfocado suas estratégias: (i) no uso inteligente de telessaúde, filtrando casos onde não se aplica; (ii) na comunicação efetiva com os pacientes cadastrados e planos de saúde sobre o retorno ao pleno funcionamento e segurança dos hospitais; (iii) na priorização de atendimento em função de critérios clínicos; (iv) na higienização dos espaços e apoio ao distanciamento social nas instalações; (v) no gerenciamento adequado de materiais, suprimentos e medicamentos; (vi) no monitoramento da agenda dos pacientes, com mensagens programadas sobre datas e horários flexíveis quando necessário; e (vii) na comunicação prévia com pacientes e corpo clínico sobre medidas de higiene e distanciamento social para a segurança pós-pandêmica nas instalações do hospital.

 

*André C. Medici é economista social e da saúde, consultor internacional, trabalhou entre 1996 e 2020 no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e no Banco Mundial. É editor do Blog Monitor da Saúde. O autor agradece aos comentários e sugestões de Ary Costa Ribeiro.

 

Os artigos publicados não traduzem a opinião da Anahp. A iniciativa tem o objetivo de trazer a perspectiva de diversos elos do setor de saúde, em um momento em que informação é a base para o enfrentamento à pandemia.

 

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